LIDANDO COM OUTRAS PERDAS... Outra situação que exige, na família, demonstrações de afeto, amor, cuidado, carinho e respeito pelas crianças é quando os pais decidem a separação.
Nesta situação o casal tem de buscar toda a maturidade possível para encaminhar bem a reação dos filhos à nova fase que se inicia. E, por mais que os pais sejam cuidadosos, a rotina muda. Bebês ficam agitados, crianças pequenas voltam a fazer xixi na cama e crianças crescidas passam a dar problemas na escola. Separação não é só drama: se a decisão aconteceu, ajudar os filhos a encarar a nova fase será importante para todos.
O primeiro passo a ser encarado é não deixar que as próprias frustrações, ou mesmo um certo complexo de culpa atrapalhe a educação dos filhos.
É comum nesses casos que se acabem sendo fracos na educação, não impondo limites pensando em algo do tipo “coitadinho, já sofreu demais com a separação”. Fazendo isso, porém, acaba-se por desrespeitar outro direito dos filhos, que é a educação, e não há educação sem limites.
É muitíssimo comum também na separação de um casal, cada qual fazer comentários negativos sobre o outro diante dos filhos. E não há atitude mais insana e nefasta para os filhos do que isso. Na verdade, o pai ou a mãe que critica o outro diante do filho, no fundo denota uma postura egoísta, que não sabe amar o filho de verdade. É que, salvo raras exceções, o filho mantém vínculos afetivos muito fortes com o pai e com a mãe. Assim, quando se critica o outro, quem sofre é o filho, que apesar de tudo ama a ambos.
É possível manter uma educação saudável, apesar da separação se o pai e a mãe se esforçarem por lembrar das qualidades do outro e ressaltarem isso diante dos filhos. Afinal, não existe pessoa que somente tenha virtudes e outra que só tenha defeitos. Qualquer pessoa, por pior que seja, tem sempre qualidades que podem ser reconhecidas. E essas podem ser elogiadas e ressaltadas diante dos filhos, que com isso sentirão a segurança de que tanto precisam. Terão então olhos para enxergar que os pais, apesar de tudo, os amam de verdade. E, repita-se, não demonstra que ama de verdade o filho o pai ou a mãe que não respeita o outro, seja qual for o motivo da separação
Coma ajuda de especialistas, podemos dizer que há uma forma de preparar a criança conforme a idade dela. Vai depender da fase do desenvolvimento, da dinâmica da família e, claro, de como isso será conduzido pelos adultos. Por isso, cada faixa etária pede um tipo de cuidado e uma abordagem. Dividimos aqui as reações mais comuns e uma série de orientações baseadas nas idades das crianças. É claro que isso pode variar muito, mas serão dicas preciosas nesse delicado momento familiar. E mais: a separação do casal não precisa ser motivo para mais culpa em relação aos filhos. Mas deve ser encarada com responsabilidade e como uma nova chance para todos.
PARA CRIANÇAS DE 0 A 2 ANOS
É uma fase de adaptação, e o bebê, como uma esponja, absorve tudo ao seu redor. Especialmente nos primeiros meses de vida, a mãe é seu universo e o que ela sente reflete diretamente na saúde e no estado emocional do filho. Quando a separação acontece neste período, ela tende a ficar mais frágil ainda: a mãe perde o acolhimento e a proteção que costuma receber do marido.
Noites mal dormidas, comportamento irritadiço, mudanças no apetite e sintomas como dor de barriga, mal-estar e febre sem motivo aparente são algumas das respostas dos bebês a essas mudanças. Convém evitar conversas tensas ou mesmo agressivas diante dele (mesmo que ainda não tenha um bom entendimento das palavras, ele pode notar o tom). Se a mãe ainda estiver amamentando, que as visitas do pai não atrapalhem esse momento. Manter o ambiente de casa tranqüilo e respeitar a rotina da criança é essencial. Com os mais crescidos, a separação pode desencadear desânimo, redução do interesse por brincadeiras e atividades rotineiras. É nesta fase também que o universo do bebê passa a não se restringir mais à mãe e o pai começa a desempenhar um papel diferente para ele. Por isso é importante que a distância não destrua o vínculo entre eles. Aproveitando que as mamadas são menos freqüentes, as visitas podem ser um pouco mais prolongadas. Mas o ideal é que não passe, por exemplo, um final de semana inteiro longe da mãe. Uma opção seriam encontros durante a semana, mais breves. Nesses momentos, o pai pode, inclusive, ter a ajuda da mãe, da irmã ou de alguém com experiência, até mesmo a babá. Porém, é fundamental que ele converse com a mãe da criança para os detalhes da rotina.
PARA CRIANÇAS DE 2 A 6 ANOS
Diante da separação, a criança pequena costuma fazer perguntas como “cadê o papai?”,“por que a mamãe não está aqui?”, “por que vocês brigaram?” etc. Suas dúvidas e inseguranças, no entanto, vão além do que perguntam. Existe o medo do abandono,da perda do amor do pai ou da mãe e um sentimento de culpa. O psicólogo Ricardo Muratori explica que nesta fase predomina a fantasia: a criança acredita que o que ela pensa acontece. Entre os meninos, por exemplo, é comum desejarem a mãe só para si em um momento e, em seguida, identificarem-se mais com o pai. “Quando a separação acontece diante desse conflito afetivo, vem a culpa, a idéia de que foram seus desejos que desencadearam todo o processo”, afirma. As crianças também podem regredir em relação a aquisições já feitas (voltam a fazer xixi na roupa, não articulam as palavras tão bem quanto faziam, por exemplo). Podem demonstrar raiva, angústia, agressividade, ter choros freqüentes e birras mais acentuadas, alterações de sono e de apetite, dores de cabeça, vômitos e febres. Na hora de ir à escola, podem surgir dúvidas do tipo: “Se meu pai já saiu de casa e me deixou, será que minha mãe vai voltar para me buscar?”.
Para acalentar essa criança e acalmar seus conflitos emocionais, é preciso muita conversa. Ela tem de perceber o interesse dos pais em seus sentimentos.“Verbalizar colocações como ‘entendo que você esteja triste e que esteja sendo difícil’ é positivo, pois ajuda a criança a se sentir compreendida e amparada”,diz a psicóloga clínica e educacional Celise Govêa. É importante ainda a criança ter um canal pelo qual expresse, ainda que inconscientemente, seus sentimentos. Podem ser desenhos, jogos, brincadeiras, livros, simulações feitas com seus brinquedos e bonecos. Que haja, enfim, um espaço em que ela expresse simbolicamente a raiva que sente dos pais, a sensação de abandono ou o que estiver em seu inconsciente. A criança provavelmente não entende tudo o que está acontecendo, mas, enquanto empurra carrinhos, dá banho em uma boneca ou anda de bicicleta, ela projeta seus sentimentos e elabora os conflitos que está vivendo. Nesta idade há uma série de novidades que envolvem outras decisões importantes quanto à educação. Como a escolha da escola, por exemplo. É importante que seja uma questão de comum acordo, e que ambos participem desde a fase de adaptação até as reuniões com professores. Mas é no dia-a-dia, perguntando detalhes, que acriança vai sentir a presença dos pais.
PARA CRIANÇAS DE 7 A 10 ANOS
A partir dos 7 anos, as crianças conseguem formar conceitos, percebem o que está acontecendo, têm um julgamento mais apropriado da situação. Tendem a fazer muitas perguntas e a manifestar tristeza e descontentamento de maneira clara e direta. O que elas precisam? De colo.
A psicanalista Miriam Chicarelli Furini afirma que, quanto maior a criança, maiores são suas condições psíquicas para lidar com a ruptura. Mesmo assim, há o sofrimento, claro em sintomas como distúrbios de sono, alterações no comportamento, irritabilidade, desejo de se isolar, mudanças no apetite.
A escola é uma boa vitrine. Atitudes mais agressivas com amigos e professores, comportamentos mais agitados, isolamento e queda no desempenho são alguns sinais de que a criança não está bem. Por isso é fundamental que a escola seja informada do que está se passando em casa.
A rotina da criança e seu círculo social, de qualquer forma, devem ser mantidos.É importante para ela, nesta fase, ir à escola, preservar relacionamentos com amigos, ter a chance de trocar experiências, tirar a mente um pouco do ambiente familiar e sustentar as responsabilidades do dia-a-dia. Bem como é fundamental manter os eventos sociais familiares, de ambas as partes. Se o dia da festa calhar de ser em final de semana ou dia em que o combinado seja estar com o outro pai, é hora de negociar encontros substitutos. Tudo pela convivência.
No geral, tente sempre conversar. É importante deixar a criança expressar sua tristeza, sem pressioná-la para reagir positivamente. Além de falar, a criança deve ter outras maneiras para expressar seus sentimentos, extravasar, deixar fluírem suas emoções. Isso pode acontecer por meio da prática de um esporte, em atividades com arte e música e até por meio de brincadeiras. Os pais têm de ficar atentos a isso e, se notarem a criança demasiadamente fechada, uma terapia pode ser uma boa alternativa.